Fotografar no Pantanal é como escutar um sussurro da natureza — há um ritmo, quase silencioso, que se revela no olhar atento. Esta imagem nasceu em um desses momentos. Um instante em que o acaso e o olhar se encontraram.
A biguatinga, com suas asas abertas em pleno voo, parece dançar no céu. Sua forma alongada e o desenho das asas remetem a esculturas renascentistas — há algo de divino aqui, quase como um anjo recortado contra o firmamento. O contraste entre a ave e os galhos secos do primeiro plano traz uma poesia visual: a leveza do voo contra a rigidez da terra. É uma dicotomia entre movimento e pausa, entre o vivo e o estéril.
Artisticamente, penso em referências como Henri Cartier-Bresson e sua obsessão pelo momento decisivo, quando todos os elementos se alinham em harmonia. Aqui, há um equilíbrio natural entre os galhos retorcidos e o movimento gracioso da ave. O preto e branco amplia essa linguagem, elevando a fotografia a uma atmosfera atemporal — uma paleta minimalista onde o jogo de luz e sombra molda a narrativa.
Os galhos despidos também me remetem às pinturas de José Pancetti, com suas linhas secas e paisagens quase minimalistas. Enquanto Pancetti eternizava a solidão das paisagens marinhas, aqui, a solidão é transformada pelo voo da biguatinga, uma metáfora de liberdade e esperança que rompe o silêncio.
Há mensagens implícitas nesta imagem. A persistência da vida em contraste com a dureza do ambiente. A busca pelo céu mesmo quando tudo parece árido. Não é apenas uma foto de um pássaro. É um manifesto sobre a beleza oculta no efêmero — um instante fugaz, mas eterno no clique.
O Pantanal é um palco generoso. O voo desta biguatinga é a poesia que ele me ofereceu naquele dia. Talvez, mais do que um registro visual, seja um lembrete: é preciso aprender a voar sobre os galhos secos da vida.